domingo, 23 de março de 2014

Curtinhas

Beija-flor

A voz de Deus balança o verde das palmeiras,
passarinhos pingam de amarelo
as tardes azuis do verão.
Enquanto o sol estende seus cabelos
no espelho de teu rosto
antes sombrio,
colho  o pólen de tua boca
e anoiteço desprovido de escuros.

 Técnica

pra poesia não basta inspiração
tem de saber olhar as coisas
pela janela.


Inspiração

não costumo escrever
quando
ver
sejo.

Sem título

di
vertida lágrima
di
versa
di
vertido verso
di
fuso



sexta-feira, 7 de março de 2014

Gosto não se discute?



Gosto não se discute, estética sim.  A estética é a ciência do belo e o conceito deste é tão relativo quanto à idéia que construímos sobre o feio. Lembro-me de um episódio da série de animação “Caverna do dragão” em que um personagem foi transformado num homem-sapo. Vivendo com os outros homens-sapo que o haviam raptado, sofria profundamente com sua aparência, fato que os demais não entendiam por achá-lo extremamente belo. No dia em que o feitiço se desfez e ele voltou a ser humano, os homens-sapo correram assustados por causa de sua “cara horrível”.
O gosto pode ser passional, pessoal e acrítico. Posso gostar de um livro exclusivamente pelo fato de ele me entreter e ser de fácil compreensão. Meu prazer em dançar uma música desenvolve em mim um gosto especial pelo ritmo que me embala. Dar muitas risadas durante a exibição de um filme leva-me a classificá-lo como excelente, independentemente de suas qualidades técnicas. O gosto também é resultado da educação recebida pelo sujeito. Aprendemos a gostar predominantemente das músicas e dos filmes da televisão, acreditando ingenuamente que gostamos do que é melhor, já que para grande maioria, o melhor é o que é exibido pela telinha.
Assisti recentemente ao vídeo clip da “cantora” Valeska Popozuda. Diverti-me bastante, mas  é um dos piores produtos que já vi do gênero. Não associo o belo à perfeição moral ou à reprodução da natureza como alguns filósofos da Antiguidade, mas entendo que toda linguagem artística possui critérios próprios de composição, que são mutáveis, pois acompanham a evolução dos outros ramos da cultura. Porém o único critério que se observa na composição de obras como o referido clip é o do faturamento rápido. Este tem sido também o critério de filmes como Crô e toda aquela série  com comediantes da Rede Globo que apenas reproduzem as velhas piadas contadas todos os sábados no “Zorra Total”.  São filmes ruins, mas isso não tem nada a ver com gosto. Afinal “há gosto para tudo”.
Ao afirmarmos que gosto não se discute e assim deixarmos também de discutir estética, permitimos que grandes artistas percam espaço para  caça-níqueis que não se ocupam do belo e formam um público cada vez mais numeroso de pessoas incapazes de perceber a diferença (estética) entre uma comédia do Leandro Hassun e um filme do Wood Allen. Tenho o direito de (por gosto) preferir o Hassum, mas não posso ser incapaz de reconhecer as qualidades evidentes em filmes como Blues Jasmine (último do Wood Allen). O clip da “popozuda” termina com ela sentada, acariciando um tigre de bengala. Que bela oportunidade o animalzinho perdeu!